O juiz eleitoral titular da 103ª Zona Eleitoral do estado da Bahia, Maurício Alvares Barra, causou polêmica em entrevista à Rádio Piemonte, do município de Miguel Calmon — que faz parte da zona em questão junto à Várzea do Poço — ao supostamente ameaçar prender eleitores que tenham testado positivo para a Covid-19 e forem às urnas com o vírus ativo, no próximo domingo (15).
“Eu vou passar para os presidentes das sessões a lista de pessoas que testaram positivo para Covid-19 e que ainda não se recuperaram. Se alguma dessas pessoas aparecerem na escola para votar, ela vai sair de lá presa. Com base nos artigos 267 e 268 do Código Penal, essa pessoa além de não votar, vai ser presa no mesmo dia”, afirma Maurício durante a entrevista.
“Não há norma que proíba a votação em caso de sintomas ou contaminação pela Covid-19. As medidas de segurança tomadas pelo TSE são capazes de proteger os eleitores inclusive na eventualidade de haver pessoas contaminadas. Assim, o tribunal destaca a importância de serem seguidas todas as orientações sanitárias, como uso de máscara e face shield (no caso do mesário), distanciamento social e uso de álcool em gel dentro da seção”, diz a nota do TSE.
O BNews entrou em contato com dois advogados criminalistas para comentar sobre a possibilidade de prisão e acusação com base no Código Penal. Ambos se posicionaram contra a suposta ameaça do juiz eleitoral, afirmando que ela não teria base jurídica para ser efetuada. Além disso, a reportagem também conversou um advogado eleitoral sobre o ocorrido em Miguel Calmon.
“Os tipos penais invocados exigem a existência de determinação do poder público que proíba esta circunstância. Atualmente não há esta proibição. Não há norma que obrigue que eventual pessoa contaminada se isole absolutamente em seu lar. Existem recomendações do TSE baseadas em estudos medicinais, que, se respeitados, afastam a caracterização de qualquer crime. Em acréscimo, seria a hipótese, inclusive, de crime de menor potencial ofensivo, que sequer autoriza ordinariamente prisão em flagrante. Sem falar, ainda, que não se pode violar prontuário médico para divulgar eventual enfermidade de quem quer que seja. A medida também neste ponto seria ilegal”, afirma o advogado criminalista Pablo Domingues.
“Ao meu ver, esse ato do juiz, se assim ele o fizer, é ilegal, porque ele está se utilizando da autoridade que ele tem pra poder supostamente ameaçar as pessoas. O art. 267 do CP fala sobre causar epidemia mediante a propagação de germes patogênicos – ou seja, a pessoa contaminada teria que, com vontade, desobedecer as normas de vigilância sanitária (uso de máscaras, distanciamento, uso de álcool em gel, etc), com a intenção de propagar o vírus. O art. 268 do CP fala sobre infringir determinação do poder público. Nesse caso, não há infringência à determinação, já que o TSE não proíbe que quem esteja contaminado vote, mas apenas recomenda para que, aqueles que estiverem suspeito ou mesmo infectados, não compareçam e justifiquem depois. Há uma diferença grande entre recomendação e proibição”, complementa o advogado criminalista André Luiz Moura.
“Até concordo que a pessoa que resolve ir votar, mesmo consciente de que está infectado, possa responder por crime contra a saúde pública. Mas daí ser presa é flagrante é outra história. A prisão significará uma exposição para outras pessoas que se encontram reclusas e para os agentes públicos que terão que ter contato com o infectado, aumentando o risco de contaminação. A Justiça Eleitoral deve adotar todas as medidas para preservar a população e àqueles que estão a serviço da justiça. Tanto que o TSE fez diversas campanhas de conscientização. A intenção do magistrado parece nobre, mas, por outro lado, a prisão em flagrante pode significar uma disseminação maior do vírus. Desconheço orientação do TSE ou do TRE para que a prisão em flagrante ocorra nesses casos”, finaliza o advogado eleitoral Hermes Hilarião.
Vale lembrar que o exercício do voto é obrigatório para todos os maiores de 18 anos e menores de 70 anos, no entanto, em caso de febre no dia da votação ou ocorrência de Covid-19 no período de 14 dias antes do dia da votação, o eleitor é recomendado pelo TSE que fique em casa. Quem deixar de votar por essa razão deve apresentar documento, como atestado, declaração médica ou teste que comprovem a condição. É possível justificar o voto em até 60 dias após a data das eleições.
É possível obter mais informações sobre como serão os protocolos seguidos pela Justiça Eleitoral nas eleições municipais de 2020 conferindo o Plano de Segurança Sanitária elaborada pelo TSE em com a ajuda de uma consultoria sanitária formada pela Fiocruz e pelos Hospitais Albert Einstein e Sírio Libanês.
Fonte: BNews, 11/11/2020
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