Pacaraima; São dois idiomas interagindo. O espanhol e o português aparecem não só na fala fluente de brasileiros mas também nas placas de comércio da cidade de 20 mil habitantes. A proximidade com a Venezuela marca hábitos alimentares de Pacaraima, rostos e o jeito de viver.
A cidade mais ao norte do estado de Roraima saiu do anonimato para o Brasil desde que o país passou a ter noção de que esta parte da fronteira tinha virado entrada para milhares de venezuelanos que fogem de um país marcado pelo desemprego, pela inflação nas alturas, pela fome, pela miséria e também pela forte repressão aos opositores. Não é difícil de se ouvir, “a Venezuela está destruída”. Talvez a única chance.
Chegar ao Brasil já é uma vitória para muitos. A viagem no país vizinho é mais difícil conforme a situação financeira do migrante. Quem tem algum dinheiro costuma vir de ônibus, carona. Mas quem já sai sem nada, e são muitos assim, só tem como opção deixar a Venezuela à pé. E isso vale para jovens, adultos, famílias com crianças pequenas, idosos. Otulio Pacheco, vigilante de 53 anos, entrou no Brasil apenas com a vontade indescritível de recomeçar. “Ninguna plata en el bolsillo”, ou seja, sem dinheiro. Pelo tom da conversa, ele sabe que aqui tem que dar certo. Otulio, que veio com mulher, filha e dois netos, aceita qualquer trabalho.
E o Brasil? Desde que a situação se complicou e os venezuelanos passaram a vir em massa para cá, o Brasil tem feito a Operação Acolhida. A iniciativa do Governo Federal existe desde 2018 e é coordenada pelas Forças Armadas em parceria com agências da ONU. Organizações nacionais e internacionais e setor privado também integram a linha de frente que tenta amenizar o sofrimento de quem troca a Venezuela pelo Brasil.
Nesses anos todos foram realizados cerca de 2,5 milhões de atendimentos. A interiorização – que é o deslocamento para outras regiões do país com perspectiva de vagas de emprego e reencontros familiares, por exemplo – já passa dos 84 mil registros.
Aqui os venezuelanos também ficam alojados em abrigos onde recebem três refeições diárias. Antes disso tiveram acesso a vacinas e um suporte para que tenham sua situação migratória acertada, ou seja, não circulam ilegalmente.
O que eles querem; Não muito, lutam para reencontrar a dignidade que ficou perdida nessas últimas décadas de governos de Chavez e Maduro. Afirmam que estão atrás de um emprego que os permita, além do sustento por aqui, mandar alguma ajuda para quem ainda está por lá.
E os sonhos? Simon Ortin, perito agrícola de 58 anos, ainda quer ter condições de voltar para seu país. Mas para que isso aconteça, ele diz que não só o governo tem que mudar, mas todo o sistema que destruiu a Venezuela.
R7, 18/10/2022