Os relatos são de usuários da saúde pública em Dias d´Ávila, Região Metropolitana de Salvador, e refletem um cenário de descaso e abandono. Por motivos óbvios, os nomes dos entrevistados serão mantidos em sigilo.
A situação não é nova. A TARDE denunciou em janeiro de 2023 a falta de remédios e a dificuldade para marcação de consultas e exames. Desde então, a situação não melhorou em nada. Pelo contrário, se agravou ainda mais.
Uma das pacientes ouvidas pela reportagem está grávida e teve que andar mais de 2 km para tentar agendar um ultrassom. Ao chegar, foi comunicada que deverão retornar à unidade de saúde de origem e aguardar. Até quando? Essa pergunta fica sem resposta.
É na Central de Marcação que o descaso fica mais evidente. A Secretaria de Saúde limitou a oferta de consultas nos bairros (veja ofício abaixo) e determinou o encaminhamento para a central “sem garantia de vaga”. Com isso, para conseguir atendimento a um especialista, os cidadãos têm que virar a noite na fila.
A central dispõe de uma recepção com cadeiras e ambiente climatizado, mas o espaço só abre às 8 horas da manhã. Antes disso, a espera que começa a partir das 2 horas da madrugada – para alguns até no dia anterior -, acontece ao relento, muitas vezes sob chuva, além do sacrifício do deslocamento dos locais mais distantes e do risco de assaltos.
“Mandou a gente retornar sexta-feira, dia 6, mas vai marcar primeiro dos vereadores do atual prefeito e o que sobrar é nosso, loteria, quem pegar, pegou”, acrescenta outra moradora da cidade que denuncia um esquema de loteamento de vagas entre os vereadores da base do prefeito Alberto Castro.
A denúncia não é isolada. Muitos pacientes relatam que, após varar a madrugada na fila é comum ver as senhas se esgotarem rapidamente. Já houve caso de chamar apenas 10 pessoas e mandar dezenas de volta para casa.
“A gente tem que vir dormir na fila, sentar em papelão, chovendo ou não, com idade avançada ou não, mas se chegar algum assessor de vereador com uma pasta de documentos tem vaga pra eles”, corrobora outra mulher que tenta agendar um neurologista para o neto e já perdeu algumas noites na fila.
Bairros
No CAPS, os pacientes que precisam de remédios de uso contínuo também enfrentam problemas. No bairro Jacumirim a filha de uma idosa ouviu que precisaria esperar atender todos os agendados para depois ela passar pelo médico, sem qualquer prioridade. “Você acha que minha mãe, que tem problema de Alzheimer, com 78 anos, ia ficar lá até meio-dia ou sei lá que horas”?
No posto do bairro Almirante Saldanha, a neta de uma idosa com artrose, além de não conseguir marcar a consulta para renovar as receitas ouviu que somente sua avó poderia realizar o agendamento. “Eu falei que ela sente dor nas pernas e nem sempre ela tem dinheiro pra pagar um Uber ou moto. Mesmo assim ele disse que eu não podia, tem que ser ela pra pegar”.